Por José Joacir dos Santos, psicoterapeuta e jornalista
A leitura da borra do café na xícara é uma tradição muito antiga. Acredita-se que tenha surgido na famosa Rota da Seda e se mantém viva em vários países, desde a Turquia a países do Leste Europeu. Tive o prazer de aprender com uma senhora, muito velhinha, na Polônia, durante a ocupação daquele país pela União Soviética (anos 1980). Naquela época, trabalhando em Varsóvia, o meu escritório recebia todo mês um saco com café em graus, mandado pelo Instituto Brasileiro do Café. O saco tinha a famosa tarja verde-amarela CAFÉ DO BRASIL. Muitas vezes o café era confiscado ou desviado do seu destino, mas não faltava. Não sabia torrar nem tinha como fazê-lo, mas isso não demorou muito. Fiquei doente e fui a um hospital polonês, onde ninguém falava outra língua fora do idioma polonês. Fui atendido e a médica me perguntou sobre o café do Brasil. Na próxima consulta levei um quilo do café e a notícia se espalhou pelo hospital. Não demorou muito e eu estava distribuindo o café entre os pacientes, a maioria constituída de pessoas idosas, que adoecia no pesado inverno. A médica me disse que o café aliviava as dores das juntas das pessoas velhas no inverno e eu virei doador de café até que deixaram de mandar o Café do Brasil.
Andando por Varsóvia, numa tarde de nevasca forte, uma senhora idosa me chamou a atenção em um lugar onde vendiam uma sopa quente que até hoje não sei de que era. A Polônia sofria do boicote de alimentos da União Soviética e muita gente passava necessidades. Eu mesmo trocava qualquer coisa por batata e repolho. A senhora falou comigo em uma língua que nada entendi até que ela falou em polonês e eu já arrastava alguma coisa. Disse a ela que era brasileiro e ela logo falou em café. A mulher, que deveria ter uns 70 anos (e eu quase 30) me convidou para ir à casa dela. Morava sozinha em um pequeno apartamento, tão antigo quando ela, tudo muito limpo e organizado. Tinha uma mesa redonda, forrada com uma toalha bordada. Fui para a cozinha e eu pensei que iria fazer um chá. Para minha surpresa ela fez um café no estilo turco. Como ela tinha aquele café eu não sei por que no mercado local era impossível de ser achado.
Sempre sorridente, serviu o café em duas xícaras brancas, de porcelana muito antiga. Como o meu polonês não era suficiente para um diálogo mais profundo, ela passou a misturar várias línguas, inclusive francês, italiano e aí começamos a nos entender. Quis retirar as xícaras da mesa e ela não deixou. Ficou silenciosa e passou a se concentrar no interior da xícara, na borra do café. Fez uma leitura do que via. De início eu não dei muito crédito, mas algo na minha vida tinha a ver com o que ela dizia naquele momento. Fiquei muito curioso. Ficamos amigos e tomamos vários cafés juntos, especialmente quando fiz a surpresa de lhe presentear com café brasileiro natural. Aos poucos não sabia mais em que língua a gente conversava.
Além da leitura da borra do café há médiuns que fazem a leitura também de folhas de chá, sementes de árvores etc. Essa leitura muda de forma e de acordo com a cultura, seja no Leste Europeu ou na Turquia. O que eu aprendi foi simplesmente tomar o café, não pensar nada. Deixar a xicara sem tocar nela e depois de seco o café restante na xícara observar que imagem vem na sua cabeça assim que a vê. A mente tem que estar totalmente limpa para deixar a intuição falar. Não precisa virar a xícara no pires como os turcos fazem. E funciona com qualquer tipo de café. Na medida em que você vai se conectando com essa tradição as imagens vão tomando sentido, significado e as vezes trazem muito simbolismo e sincronia com o seu momento naquele dia. Se fosse possível encontrar aquela senhora hoje lhe ensinaria a fotografar a imagem com o celular e ampliá-la para fazer a leitura.
Na tradição turca e de outros países há listas de significados e a superstição diz que a pessoa tem que pedir para você fazer a leitura da xícara. Alguns praticantes dessa técnica recomendam que se faça um café forte e aveludado, mas não vejo necessidade. Faça o café que está acostumado a fazer. A xícara, sim, deve ser branca e de porcelana. De vidro e de plástico não são recomendadas por causa da sintonia e da frequência desses materiais. Quando a espiritualidade quer se comunicar o fará de qualquer jeito. Mas é bom manter certas tradições. Claro que não toma café com essa intenção, pensando em um assunto, pode funcionar. Mas pode ser que a resposta não venha imediatamente e por isso eu deixo a xícara de lado para ver horas depois. Quando pratico isso, na intimidade dos meus amigos (ou só para mim mesmo), solicito que a própria pessoa tente visualizar a mensagem da xícara. Veja abaixo alguns exemplos. Aumente a imagem no celular e anote o que você consegue ver sem inventar nada. A mensagem da xícara é dirigida à pessoa e/ou à família de quem tomou o café. Foram muitas as vezes que tive vontade de guardar a xícara sem lavar de tão incrível são as imagens que aparem no fundo da xícara. 14/06/2020