Por José Joacir dos Santos
Sai do centro cirúrgico de catarata, cedo da manhã, com ajuda de acompanhante. Fui direto para a cama do hotel. Dormi profundamente e só fui acordado porque era hora de começar a maratona de colírios especializados. Me ajustei na cama e abri os olhos, no escuro, para receber o colírio. Imediatamente percebi que as paredes do quarto tinham desaparecido e dado lugar a uma quantidade imensurável de imagens de todas as formas, profundidades e cores. Só para ter certeza, perguntei a meu companheiro se estava vendo aquela imensidão de imagens e a resposta foi: não. Deve ser coisa da anestesia, disse ele. Procedeu com as gotinhas no meu olho operado. Fechei os dois olhos para acomodar melhor o colírio e a explosão de imagens continuou como se estivesse com os dois olhos abertos – e não estava.
Um minuto depois do colírio, abri os olhos e as imagens agora eram mais nítidas e em cores que jamais tinha percebido antes. Faltam palavras para descrever o que vi, de olho aberto ou fechado. Eram imagens geométricas. As imagens agora estavam em movimento e cresciam como se fossem milhares de flores de Dalia, com inúmeras pétalas e cores, juntas, se movendo em forma crescente. Queria olhar mais firme para cada imagem tentando identificar algum simbolismo esotérico, mas era impossível. As imagens eram vivas, em movimento constante, sincronizado, rápido. O quarto do hotel havia desaparecido e agora eu estava cada vez mais integrado àquela explosão de imagens, desenhos, símbolos e cores. As imagens agora partiam de algum lugar no espaço e em movimento sincronizado cresciam e se aproximavam nitidamente do meu rosto. O quarto não tinha mais teto nem objetos.
Controlando minhas emoções e me mantendo calado para não assustar meu companheiro na cama do lado, com seu celular ligado, olhei em todas as direções do quarto e confirmei que aquele festival de imagens vinha em todas as direções. Parei de querer controlar o que não podia. Respirei fundo, relaxei na cama e deixei acontecer. Em certo momento, estendi as mãos e atravessei as imagens. Deixei meus braços esticados serem invadidos, como se fossem ocos, por aquele maravilhoso festival de luz, cor, forma e desenhos. Passei a mão delicadamente no terceiro olho, nas sobrancelhas, e isso não impediu o fluxo de imagens. Eu era as imagens!
Chegou um momento em que quase me deixei levar por uma espécie de pânico. Teria a cirurgia do meu olho direito afetado o meu sistema nervoso central ou o terceiro olho? O que estava acontecendo, seria físico ou de outra natureza? No escuro do quarto, uma voz ecoou firme e claramente na minha mente: calma, aproveite! Quase me assustei. Chamei meu companheiro para lhe perguntar se ele tinha falado comigo, mas ouvi seu respirar, estava dormindo. Não sabia que horas eram. Voltei minha audição para as janelas, na tentativa de ouvir o barulho da rua, mas a cidade de Brasília era toda silêncio. Com o quarto totalmente escuro, abri com cuidado os dois olhos e me integrei às imagens para nunca mais esquecê-las.
Esse fenômeno durou mais ou menos 24 horas, não importava a hora ou se era dia ou noite. Tentei interromper de várias maneiras, mudando o pensamento, cantando musica mentalmente e até fazendo orações, mas nada interrompia. De início pensei que a cirurgia tivesse afetado a minha terceira visão. Mas, todas as vezes que levantava uma pergunta mental havia aquela voz para dizer sim ou não. E eu adorei aquela relação.
Quando as imagens começaram a desaparecer, no final do segundo dia, arrisquei uma última pergunta: perdi a terceira visão? Não! Ajustamos a memória dos seus olhos à nova realidade do seu ser! No terceiro dia, tive o outro olho operado e já me preparei para o que pudesse acontecer. E aconteceu: Nas horas que se seguiram à segunda cirurgia, entre um colírio e outro vi imagens de seres de épocas diferentes. Eles nada diziam, apenas sorriam. Era como se celebrassem, através de mim, o avanço sincronizado entre ciência e espiritualidade. Um deles me disse, carinhosamente: não se emocione, aguente!
Havia muito temor antes da cirurgia, especialmente porque eu já tinha passado por duas outras, de miopia, em cada olho. Os médicos haviam me alertado sobre o risco. Mas, com a graça de todos os seres universais, hoje vejo melhor do que nunca, tanto a olho aberto quanto a olho fechado. Todos os meus temores se derreteram para sempre.
Brasília, DF, 30 de janeiro de 2023