Sofrendo de congestão nasal provocada pela poluição de Nova Delhi, deitei-me meio sentado, forrado com travesseiros para tentar respirar normalmente. Adormeci. Senti algo pesado descendo por meus ombros. Era uma cobra. Já havia muitas outras de todos os tamanhos e cores sobre o meu corpo. Mantive a calma e uma mulher pintada de amarelo se projetou na minha frente. Sorrindo, debochadamente, e me perguntou se estava gostando daquelas cobras venenosas tomando conta de mim. Comecei a rezar, mas estava com medo. Ela disse: quem diria, um homem com tanta luz agora entregue à escuridão, que é minha! Seu rosto se transformava a cada segundo e suas formas se alteravam. Em certo momento ela chegou bem perto dos meus olhos e disse: um ato simples e você terá tudo o que desejar, é só me beijar. Naquele momento me lembrei de projetar mentalmente a imagem de Jesus.
Ela deu passos para trás, em estado de choque, com os olhos arregalados e se vestiu de aparência masculina. Mantive a imagem e aos poucos ela se afastou e desapareceu, assim como as cobras. Nunca tive um pesadelo como aquele em toda a minha vida, com imagens tão nítidas, reais, aterrorizantes, que me faziam confundir entre a realidade e a ilusão. Nunca tive tantos pesadelos com cobras como os que tive em Nova Delhi, Índia. Sei que cobra representa a cura mas na Índia a cobra é utilizada em todo tipo de seita. Se aquela mulher pertencesse à luz e estivesse interessada na minha cura a proposta dela seria diferente. Senti o som cavernoso de suas palavras e a minha intuição dizia que ela era do outro lado da luz. Conta a lenda que quando Buda estava em processo de iluminação uma enorme serpente se prostrou atrás dele e cobriu a cabeça dele com sua própria cabeça para que a chuva não o molhasse. Há cobras na mitologia de todas as culturas do mundo, com sentido variável, mas quem nunca foi à India precisa saber que há de tudo debaixo do céu. Nova Delhi, agosto de 2011
Por José Joacir dos Santos – jjoacir@gmail.com