Por José Joacir dos Santos, jornalista e psicanalista
Casar-se, se amigar ou morar junto pode ser muito bom para quem está seguro de que a relação é de reciprocidade afetiva, cuidado recíproco, compromisso consciente. O amor não basta nas relações de casamento ou ajuntamento, tampouco naquelas a garradas a tradições, famílias e propriedades. Esse tipo de relação vem de um longo histórico de comércio, trazido pelos monarcas europeus para toda a América Latina. É o mesmo comércio que insistiu em abrir suas portas no auge da pandemia de Covid-19.
A base daquelas relações é a procriação e com isso aumentar os negócios da família e do estado. Esse modelo se repete nos livros de história da colonização europeia. A maioria dos países onde a cultura é casar-se para segurar bens, crenças e religiões vive em conflitos, tão inflamáveis quanto o ódio. Imagine o que ocorre com uma pessoa que se casa para esconder sua sexualidade ou para se livrar de um pai carrasco ou por qualquer outro motivo que não seja amor!
Amor é a base de tudo na vida, mas é muito fácil confundi-lo com paixão. A paixão é muito fácil de identificar, exceto para quem está envolvido na situação. Aquela febre desesperada que algumas pessoas têm, que as torna incapazes de ignorar qualquer coisa pela pessoa que acha que ama, é só paixão. Tudo que uma pessoa apaixonada escuta em contrário entra em um ouvido e sai no outro. A amor requer uma série de situações favoráveis para perdurar. Quando o pavio da paixão ou do tesão se queima, o casal se separa e aí começa outra batalha.
O amor carnal entre seres humanos tem começo e fim. Nada é para sempre. A vida, por si, é impermanente. Mesas e cadeiras podem durar mais do que a vida de quem adquire elas. Só a construção do amor por si mesmo é quem fortalece o espírito eterno que reside em cada um de nós. Muita gente morre de velhice sem saber se amor ou se foi amada. Outras, sequer sabem o que é amor.
Paixão passa com o vento, especialmente a paixão de quem é do sexo masculino ou tem a predominância dessa energia em si mesmo. Imagine dois homens apaixonados… Existe um nível abaixo da paixão: tesão. Uma boa noitada com a pessoa que preenche todas as necessidades sexuais pode acabar na manhã seguinte, quando a febre do tesão já não existe mais. No homem, isso é fatal. As vezes o tesão do homem sobe como pipa no ar, atiçado pela energia de quem se encontra na sua frente. Virou a esquina, tudo fica para trás. Quanto se satisfaz, nem se recorda como foi a noite. Paixão e tesão não são o termômetro adequado para juntar as trouxas e morar junto. São tão passageiros quanto o calor de uma sopa numa noite de inverno. A paixão desenvolvida pela carência, pela internet, acaba com ambos os lados machucados. Carência é uma situação emocional que precisa ser trabalhada com terapia porque ela se amplia para a baixa autoestima, que por sua vez afeta a imunidade. Paixão e tesão duram tanto quanto focos de artifício. E só deixam poluição no ar.
Se a relação envolve sexo e dinheiro ou sexo como forma de “aprisionar” a outra pessoa vai acabar naquele ditado: o tiro sairá pela culatra. Mais dia menos dia tudo desaba. Toda relação onde o sexo é a base de qualquer coisa, tem a validade bem curta, inclusive casamento. Homem-galinha tem como objetivo na vida a conquista, a fragilidade de dominar outra pessoa. Grande parte deles usa o pênis como arma sem saber que no fundo da sua alma há uma dura realidade: falta amor dentro de si mesmo. Busca um pedaço do tijolo que faltou na parede de suas vidas e não sabe buscar a tijolaria. A probabilidade de encontrar o amor verdadeiro em muitos relacionamentos sexuais simultâneos é zero.
Quem casa com medo do que vai ocorrer quando envelhecer precisa mesmo é de terapia para trabalhar o medo e a baixa autoestima. Quem casa pensando que filho poderá lhe propiciar amparo na velhice pode estar guardando cobra em lata. No dia que abrir a lata, a cobra lhe matará com um bote fatal. Seria melhor investir em um bom seguro-saúde, contra incêndio, roubo, furto, perdas materiais, viajar e viver a vida. Envelhecer sem se amar e sem ter tido a sorte de ter uma família amorosa é fatal: doenças psicossomáticas.
A falta de amor faz filhos nascerem feios, defeituosos, com frequências antigas de ódio familiar do passado da vida presente ou de vidas anteriores.
Quando o homem se casa pela paixão ou pelo tesão ou pelas duas coisas juntas, não tem consciência de que o fogo vai baixar e vai que necessitar buscar na rua a substituição ou a ilusão dela. Quando isso ocorre com a mulher, a situação pode se tornar mais desastrosa porque ela é quem engravida e ninguém pode devolver o fruto de uma gravidez. Isso complica tudo quando a paixão e o tesão vão parar nos cartórios ou na igreja por obrigação ou tentativa de reparar uma camisinha não utilizada. Quase sempre a mulher acredita que o homem está apaixonado por ela para sempre. Assim, na cabeça a informação constante é: quando vou engravidar? Por isso existem muitas mães solteiras e orfanatos lotados. A paixão do namorado dura até ela anunciar que está grávida. Isso ocorre com casamento com papel passado, fruto de mal escolha.
A mulher tem uma gravidez atrás de outra, achando que o marido vai lhe amar na próxima, só complica a própria vida. A maioria das mulheres não consegue frear quando percebe que fez escolhas erradas e que milagres não acontece quando se tem uma escadinha de filhos. Casais desesperados já têm o primeiro filho antes de completar um ano de casado. Sem a solidez do amor e do comprometimento, o homem já está olhando para a moça da casa vizinha enquanto a mulher tem que se desdobrar nas funções de mãe, mulher, amante, cozinheira, lavadeira e muito mais. Ele também pode estar de olho na colega de trabalho, na moça do bar, aquela que acredita que seu poder está na vagina. E o poder da vagina tem dias contados. Usar filhos como chantagem é uma faca amolada. Usar a vagina como negócio acaba em frustrações eternas. Aquele que se casou para esconder que é gay mantém a mulher grávida para poder ter a liberdade de passar mais tempo com o seu amor gay, que não abandonou depois que se casou. Ou faz de tudo para a mulher se manter ocupada e deixá-lo livre. A mulher gay que se casa vai odiar ser mulher e ser mãe, com raras exceções.
Quando a mulher aprende, desde cedo na vida, que a flor de lis que carrega entre as pernas é uma arma, está alicerçando a sua infelicidade para sempre. Infelizmente em muitas regiões do país esse tipo de educação ainda está bem viva. Há mulheres que sabem que o amante é casado, tem filhos e fazem de tudo para engravidar, pensando que filho segura marido e que o amante dela um dia vai largar a família anterior para ficar com ela. Essa história se repete de geração para geração, mas elas não aprendem. Em muitos casos, mesmo tendo uma vida infeliz, são os pais que incentivam filhos a se casarem de qualquer forma, especialmente as filhas. E assim o erro se perpetua como uma bola descendo de ladeira abaixo. A crença de que a mulher é sempre um ser desamparado sem um homem ainda vai perpetuar por muitas gerações. Infelizmente há homens que também acham que sem uma mulher do lado são como uma dança sem par e isso tem muito a ver com a cultura familiar.
Mulheres com histórico de abuso sexual dentro da família tendem a não perceber a sexualidade como um assunto natural e que pode trazer prazer e saúde. O abuso, o estupro, o trauma e a obrigação de esconder o sofrimento para não morrer pode acabar se tornando, em cabeças confusas, que sexo é uma moeda de troca. Esse erro, fruto de traumas, acaba amarrando suas vítimas em relações afetivas tóxicas, sem amor, violentas. Nos dias de hoje, jovens mulheres continuam cometendo os mesmos erros. Quando o homem adulto se volta para um menor de idade com a intenção de estupro/abuso ele pode estar se voltando para suas próprias memórias de abuso ou estupro, escondidas ao longo da vida. Quem não coloca as memórias de um estupro para fora acaba sendo vítima delas mesmas: a doença emocional que pode se tornar violenta.
Não é que o ser masculino seja mal por natureza. Longe disso. Mas é bom saber que o que guia o homem na vida é o que ele tem entre as pernas. Quer ele seja educado em família tradicional ou desastrada, é tudo igual. E o machismo incentiva essa crença. Por isso é que existe a homofobia. O homem gay não engravida, não tem filhos sanguíneos (pelo menos a grande maioria) e isso pode parecer uma ameaça aos negócios daquelas famílias que só pensam em negócios; daquelas naquelas com histórico de violência familiar, machismo, castração religiosa. O tamanho do pênis pode se tornar um pesadelo em homens fragilizados, com histórico de famílias não amorosas.
O psicanalista Freud não estava totalmente certo nas suas teorias envolvendo a sexualidade, mas não é por isso que devemos ignorar a sexualidade na saúde mental e emocional. Toda pessoa fragilizada emocionalmente, e que nega suas fragilidades, busca segurança, mesmo mascarada, para suas fragilidades emocionais. Alguns mergulham em religião proibidora, amarrada nas bíblias mal traduzidas, mal interpretadas, cheias de intermediários que se acham procuradores de Jesus na terra. A maioria desses intermediários vive no passado, matando as possibilidades de futuro e ignorando a vida presente. Incentivam o derrotismo, o medo, o ódio coletivo e o desrespeito por outras religiões e culturas. Quem acredita que deus é um ser castigador, carrasco, cheio de vingança, não consegue ver nada na frente do nariz e está perdendo um tempo precioso na vida. Esse tipo de pessoa é quem atrasa o desenvolvimento da humanidade, em todos os sentidos.
Fora do cristianismo, o medo e o ódio não se relacionam com deus, exceto em religiões onde o sangue de inocentes está acima da lei e da democracia. No Brasil, onde deveria reinar a democracia, o medo e o ódio elegem presidentes, senadores, deputados, prefeitos e vereadores. Em todos os países do mundo onde a religião, seja qual for, é a base das normas e leis há atraso social. A primeira vítima é a mulher e o homem é o rei da cocada preta que tudo pode.
Nada é mais bonito do que ver um casal que se ama e se cuida, se protege, constrói família com bases afetivas, luta pela melhor educação possível, longe de ideologias e crenças contaminantes. E não importa se o casal veste calça, saia ou vive como os índios nas florestas. O que realmente importa é a liberdade de escolher relacionamentos sadios, longe de ameaças castradoras e lavagens cerebrais religiosas venenosas. Toda escola primária deveria falar sobre a necessidade de se fazer escolhas na vida. Com o avanço da importância da internet cresce a violência, a intolerância, o racismo, o machismo e as doenças emocionais oriundas de falsas crenças e conceitos.
Há quem diga que casais gays são mais felizes do que casais héteros. Isso é um engano. A felicidade não está nas genitálias nem no gênero. Está no amor sem interesse financeiro, herança familiar ou preocupação em procriar etc. Há muitas maneiras de ter filhos fora do ciclo sanguíneo. Quem resolve ter filhos precisa estar ciente que eles precisam de amor desde o momento da gestação até a morte, seja do próprio sangue ou adotados.
Antes da Covid-19 o mundo caminhava para o caos. Espera-se que depois dela a palavra humanidade seja pronunciada pelo lado positivo. Cada vez mais precisamos de seres humanos conectados com o amor incondicional, universal, capaz de olhar para o semelhante com respeito, tolerância, sem envolver nisso casamentos desastrados. Ninguém precisa casar-se para ter uma família amorosa e sadia. Mas o casamento, em si, não é uma instituição impossível para nenhum dos gêneros. Família é aquele grupo que acolhe, ama incondicionalmente, está ali, junto, na doença e a saúde. Família é aquela que sabe que seus filhos devem ser criados com a ideias claras de liberdade e respeito. Liberdade sem respeito não é liberdade. A palavra liberdade não está relacionada a matar pessoas, injuriar, causar danos físicos, morais, emocionais, mentais. Família sadia é aquela que não cai no erro de achar que o que pensa e acha é o melhor para os filhos.
Ajuntamento de pessoas por qualquer motivo que não seja amor verdadeiro, sólido, aquele que arde sem queimar, não é escolha correta para a evolução do espírito. Relações tóxicas, de qualquer natureza, são cadeias eternas. Muitos de nós trazemos na memória celular esse erro de muitas vidas repetidas na mesma tecla, na mesma frequência, pelo simples fato de ignorarmos as escolhas. Quem ama pensa sempre no bem para o grupo, o coletivo, os seus.