Por José Joacir dos Santos
A luminosidade de uma lâmpada pregada no teto ou de um candieiro a querosene fica limitada ao espaço onde isso acontece. Já uma luminária aposta em um poste de luz de uma rua, embora não consiga clarear a imensidão do espaço onde se encontra, é vista de vários ângulos no seu entorno. Da mesma forma, a luz que ilumina o nosso espírito eterno se adapta às dimensões físicas e condições ambientais do corpo físico. Sua expansão vai depender da evolução e desenvolvimento da mente, do entendimento, do conhecimento e tudo isso também depende das condições psicossociais onde o indivíduo nasce e cresce. A paz interior é único caminho para a abertura dos portais da iluminação. Não há luz onde atua a violência e o radicalismo político-religioso.
São raros os seres humanos que nascem iluminados e não necessitam de esforço algum para que sua luz brilhe e tenha força suficiente para emitir seus benefícios de paz e saúde mental ao seu redor. No Budismo tibetano há toda uma cultura dedicada ao desenvolvimento espiritual, algo muito parecido com o Kardecismo brasileiro, embora esse tenha a desvantagem de não ter uma cultura solidificada na sociedade como o Budismo tem.
Elevados ao poder pela extrema direita, grupos radicais que se dizem cristãos, apelidados pela internet de “tranca ruas”, seguem em caminho contrário ao da história humana e, equivocadamente, acreditam “em deus acima de tudo”. Ignoram totalmente as lutas pela solidificação da nação brasileira, inclusive em passado recente. Quem acredita que Deus ficaria de um lado da humanidade em detrimento do outro lado? Estaria Deus do lado dos nazistas que assassinaram milhares e milhares de judeus, cristãos, ciganos, gays e negros antes, durante e depois da segunda guerra mundial?
Em vez trabalharem pelo desenvolvimento da consciência humana e, consequentemente, pela evolução espiritual, esses grupos, apoiados por supostos cristãos, se mesclam com ideologias políticas que Jesus jamais aprovaria, como o nazismo. Repetem gestos e símbolos nazistas erguendo a bandeira de Israel. Felizmente os governos da Alemanha e de Israel condenaram, de público os “tranca ruas”. Aqueles grupos não só estão na contramão da história e das necessidades da maioria da população brasileira como também não sabem o que representam as bandeiras que estão supostamente defendendo. Quem, em sã consciência, defenderia golpe militar em um país com a história que o Brasil tem? Parece que faltaram às aulas de história ou nunca leram um livro sobre as atrocidades do nazismo. A falta de leitura é fatal.
Não há sinais de desenvolvimento espiritual onde há tentativa de derrubar candidatos eleitos, pelo voto direto e secreto, para ocupar os mais diversos cargos públicos – inclusive os candidatos bolsonaristas que se elegeram. O que esse movimento tem a ver com os ensinamentos de Jesus? Nada! O que teria a ver com democracia? Nada! O que teriam a ver com cristianismo? Nada! Esse caminho radical segue em direção oposta ao cristianismo e à democracia. É um retrocesso imensurável voltar a atos e ações parecidas com o Antigo Testamento e suas coligações, exatamente aquilo que o mestre Jesus condenou na sua pouca existência física. É bom lembrar que aquele mestre foi crucificado por ser contra as normas do Antigo Testamento que milhares de brasileiros agora dizem pertencer, em nome de deus. Como podem pensar que têm direitos sobre o pensamento de Jesus?
O apelido de “tranca ruas” é bem simbólico e irônico. Igrejas católicas foram incendiadas, em passado recente, em estados brasileiros onde agora se concentraria a liderança dos “tranca ruas”, como Paraná e Santa Catarina. Não só foram incendiados templos católicos, mas, também, templos de religiões de origem africana, cuja expressão é, também, garantida pela Constituição Federal. Tranca Rua é o nome de um grupo de entidades de origem africana que trabalha pela lei, pela ordem e pelo bem.
Para quem estuda e respeita o direito de religião, na cultura afro-brasileira é possível ver a continuação de uma tradição milenar das religiões africanas: eles dão nomes simples a entidades importantes e a entidade Tranca Rua, também conhecida como Exu, tem a missão de “ajudar na abertura dos caminhos” e de “ajudar a vencer os obstáculos para conquistar objetivos”. Jamais essas entidades ficariam do lado da violência. Isto é, o Tranca Rua verdadeiro é do bem, do amor, da paz. Por ironia e ignorância, há seitas evangélicas que enquadram tudo o que não pertence a elas e a suas crenças como demônio. Falta visitas a bibliotecas. Se tivessem estudado veriam que a demonização é um equívoco histórico do ódio (veja meu livro Abuso Sexual Espiritual é Real). Já os “tranca ruas” que surgiram nas ruas e estradas do país, após o resultado das eleições presidencial, não estavam cobertos nem pela lei nem pela ordem e tampouco pelo progresso que a bandeira brasileira estampa.
Eles acreditam que as entidades afro-brasileiras são demônios. Acham que eles estão “salvos” e “acima de tudo” como se estivessem no mesmo patamar que deus. Esquecem que ninguém está acima da lei e nem pode orquestrar violência em nome de Deus. Do ponto de vista da psicologia, essas falsas premissas de superioridade e, consequentemente, de tentativa de diminuir quem não comunga com as mesmas crenças, é um prato cheio para anos de terapia. Alguns nunca se curarão porque a cura requer rejeição ao ódio. Quem odeia o mundo, odeia a si mesmo.
Crença ou religião, seja qual for, deve ser tratada no nível da vida privada. A suposta tentativa agressiva de evangelizar, praticada por seitas brasileiras, pode ser chamada de assédio. Não há, na Constituição brasileira, uma lista de religiões autorizadas e legalizadas nem outra lista de ilegais. Essa crescente confusão instalada no Brasil, propositadamente, por uma minoria de pastores brasileiros mal formados, com a suspeita de financiamento estrangeiro, coloca líderes religiosos fanáticos no patamar de negacionistas dos direitos da Carta Magna brasileira e todos os seus atos públicos contra a lei, a ordem, o direito de ir e vir e o respeito ao voto secreto como antidemocráticos, anticonstitucionais e condenáveis firmemente.
Foi chocante ver em rede nacional de televisão e em canais de tv estrangeiros cenas de violência e tentativa de implicar caminhoneiros naqueles atos violentos, cujo motivo principal seria negar o resultado das eleições livres e democráticas. Até crianças foram usadas nas manifestações, cujos participantes empunhavam, sem autorização da maioria da população, a bandeira brasileira e suas cores constitucionais ao lado de armas, fogo e danos ao patrimônio público.
Não há luminosidade espiritual em badernas, agitações e violência pública. Que a população acorde para a gravidade daqueles acontecimentos, onde pessoas comandadas por grupos radicais se achavam no direito de representar. Ninguém tem o direito de representar a maioria da população. A única e legítima forma de representação popular é o voto e o respeito aos resultados das eleições livres, diretas, ordeiras e seguras, aplaudidas pelo mundo inteiro.
Religiões e seitas radicais, assim como seus líderes, devem ser abandonadas. Quem quer criar filhos e educá-los tendo como exemplo baderneiros que trancam ruas e estradas com armas, fogo, violência, mentiras e fanatismo nazista? Uma breve viagem aos campos de concentração nazistas da Europa pode ser educativa. Veja detalhes no meu livro “Prazer entre homens”, disponível no www.amazon.com.br — 06/11/2022